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20 de Abril de 2024

O decreto do Prairial

Publicado por Mariella Pittari
há 7 anos

Como tudo no Brasil ocorre às avessas, nos deparamos com o decreto de 24 de maio de 2017, expedido pelo Presidente da República. Tendo estudado em Escola Militar até ingressar na universidade, pensava serem os golpes, contragolpes e planos Cohen ou Riocentro eventos superados do passado. Eis que a História do Brasil nos contempla com o episódio que agora presenciamos. E não há sequer um poder da República indene a críticas e apto a figurar enquanto baluarte da democracia.

Em situação na qual a legitimidade popular foi erodida, diante da persecução de interesses privados na esfera pública, não resta outra alternativa que não seja devolver ao povo a possibilidade de escolha. Lamentavelmente, votou-se nos representantes pátrios agindo-se em erro essencial quanto às pessoas, em empréstimo aos vícios dos negócios jurídicos do Código Civil. Para tal alvitre, sequer Rousseau nos serviria para falar da teoria do contrato social. Ao que tudo indica, a espoliação da qual o povo é vítima, não poderia se remeter a um contrato longínquo entre os membros da comunidade.

A princípio, conforme estabelece a Constituição, o caso parece tratar-se de decreto a ser exarado perante o estado de defesa, por tratar-se a situação fática de fragilidade institucional a hipótese para sua ocorrência. Senão vejamos:

“Art. 136. O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, decretar estado de defesa para preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza.

§ 1º O decreto que instituir o estado de defesa determinará o tempo de sua duração, especificará as áreas a serem abrangidas e indicará, nos termos e limites da lei, as medidas coercitivas a vigorarem, dentre as seguintes:

[...]”

Contudo, a lei complementar 97/99, que dispõe sobre as normas gerais para a organização, o preparo e o emprego das Forças Armadas, vem a trazer disciplina diversa acerca do emprego das Forças Armadas:

“CAPÍTULO V

DO EMPREGO

Art. 15. O emprego das Forças Armadas na defesa da Pátria e na garantia dos poderes constitucionais, da lei e da ordem, e na participação em operações de paz, é de responsabilidade do Presidente da República, que determinará ao Ministro de Estado da Defesa a ativação de órgãos operacionais, observada a seguinte forma de subordinação:

I - ao Comandante Supremo, por intermédio do Ministro de Estado da Defesa, no caso de Comandos conjuntos, compostos por meios adjudicados pelas Forças Armadas e, quando necessário, por outros órgãos; (Redação dada pela Lei Complementar nº 136, de 2010).

II - diretamente ao Ministro de Estado da Defesa, para fim de adestramento, em operações conjuntas, ou por ocasião da participação brasileira em operações de paz; (Redação dada pela Lei Complementar nº 136, de 2010).

III - diretamente ao respectivo Comandante da Força, respeitada a direção superior do Ministro de Estado da Defesa, no caso de emprego isolado de meios de uma única Força.

§ 1o Compete ao Presidente da República a decisão do emprego das Forças Armadas, por iniciativa própria ou em atendimento a pedido manifestado por quaisquer dos poderes constitucionais, por intermédio dos Presidentes do Supremo Tribunal Federal, do Senado Federal ou da Câmara dos Deputados.

§ 2o A atuação das Forças Armadas, na garantia da lei e da ordem, por iniciativa de quaisquer dos poderes constitucionais, ocorrerá de acordo com as diretrizes baixadas em ato do Presidente da República, após esgotados os instrumentos destinados à preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, relacionados no art. 144 da Constituição Federal.

[...]”

Prevalecendo a Constituição, como resquício do que um dia pretendíamos ter sido, promessas de um futuro despedaçado, necessário que seja invocado tal estado. Entretanto, para a Revolução agora desenfreada que ora se instala, talvez os remédios de crise não sejam mais suficientes. Talvez a nossa Constituição não alcançasse o estado de instabilidade na qual o país se encontra.

Como uma das possibilidades, encontrar-se-ia anular o processo de impeachment que resultou na deposição da Presidente eleita Dilma Rousseff, cuja a ementa mais recente foi no sentido de denegar a liminar, o que não impediria de apreciar o mérito:

“Ementa: MANDADO DE SEGURANÇA. MEDIDA LIMINAR. DIREITO CONSTITUCIONAL. CONTROLE DE ATOS DA CÂMARA DOS DEPUTADOS NO RITO DO PROCESSO DE IMPEACHMENT DE PRESIDENTE DA REPÚBLICA. GARANTIA DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. DEVER DE APRECIAÇÃO DA DENÚNCIA ORIGINALMENTE APRESENTADA. MEDIDA LIMINAR INDEFERIDA. 1. No julgamento da ADPF 378, Rel. Min. Edson Fachin, Redator para o Acórdão o Min. Luís Roberto Barroso, DJe 18.12.2015, o Tribunal assentou que no rito do processo de Impeachment cabe à Câmara dos Deputados autorizar ou não a instauração do processo contra o Presidente da República nos crime de responsabilidade e ao Senado Federal compete o recebimento, pronúncia e julgamento da denúncia, devendo o presente writ ser examinado à luz da Constituição, da Lei 1.079/1950 e, especialmente, do que esta Corte decidiu na ADPF 378. 2. Tratando-se de mera condição de procedibilidade para a instauração do processo de Impeachment, inexiste fumus boni iuris quanto às alegações de ofensa à ampla defesa e ao contraditório, consubstanciadas na ausência de notificação da denunciada sobre a realização de esclarecimentos acerca da denúncia e posterior indeferimento de pedido de reabertura de prazo para a manifestação da defesa, juntada de documento estranho ao objeto da denúncia e ausência de manifestação do Procurador da impetrante na sessão de leitura do relatório na Comissão Especial. Isso porque, nessa fase ainda não há acusado ou litigante. 3. A autorização advinda da votação havida na Comissão Especial da Câmara dos Deputados é para o prosseguimento sob o teor da denúncia, escoimando-se, para o efeito de apreciação ulterior em Plenário, o que for estranho ao 'vero e proprio' teor primeiro da denúncia. 4. Medida liminar indeferida.(MS 34130 MC, Relator (a): Min. EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 14/04/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-185 DIVULG 31-08-2016 PUBLIC 01-09-2016)”

Porém, o acirramento das posições politicas entre frações da sociedade, coloca a solução na órbita do Supremo suscetível à continuação da espiral de instabilidade. Bem verdade que o protagonismo da Corte poderia ter sido antecipado. Contudo, não o foi.

A próxima situação possível englobaria a possibilidade de eleições indiretas, da dicção do art. 81 da CF88:

“Art. 81. Vagando os cargos de Presidente e Vice-Presidente da República, far-se-á eleição noventa dias depois de aberta a última vaga.

§ 1º Ocorrendo a vacância nos últimos dois anos do período presidencial, a eleição para ambos os cargos será feita trinta dias depois da última vaga, pelo Congresso Nacional, na forma da lei.

§ 2º Em qualquer dos casos, os eleitos deverão completar o período de seus antecessores.”

Eleições indiretas, no cenário dramático de conspiração nos bastidores do Congresso também não se afiguraria viável. Os envolvidos nos processos e inquéritos que tramitam perante o Supremo e a Vara Federal de Curitiba os tornam parciais para efetuar a escolha da figura do Presidente da República.

Logo, uma vez rompido o Estado Democrático de Direito, DIRETAS JÁ!

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